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Kang Ki-taek (Park) e os seus sequazes atacam membros do governo no aeroporto, escapando ao cerco das forças especiais. Jang Do-jun (Kim), um polícia "rebelde" (do género que só existe em filmes de acção), pouco respeitado pelas chefias e condenado a patrulhar o metropolitano e a perseguir carteiristas, consegue sozinho mais resultados que a SWAT. Kang e Jang são velhos conhecidos e arqui-inimigos; não só por se encontrarem em lados opostos da lei mas também porque um é responsável pela morte de um ente querido do outro. E, surpreendentemente, vice-versa. A jovem Song In-gyeong (Bae) suspira de amores por Do-jun, a uma certa distância, apesar de trabalhar com um grupo de pequenos marginais, sujeito à intervenção do agente da lei que sofre de excesso de zelo em último grau. O cruzamento entre estas personagens surge no momento em que Kang ocupa um comboio da rede de metropolitano de Seoul, armadilhando-o com explosivos e impedindo-o de parar se as suas exigências não forem satisfeitas. [1]
«Tube» constitui aquilo que muitos consideram não fazer falta ao cinema sul-coreano: é um filme de acção de grande orçamento, feito ao estilo de uma qualquer fita de "grande espectáculo" vinda de Hollywood. Surge na sequência de títulos como «Swiri» (1999) ou «2009 – Memórias Perdidas» (2002), com a diferença de que o primeiro pretendia ser 51% romance e 49% acção (ou seria ao contrário?) e o segundo tinha uma história complexa baseada na História recente da Coreia. As personagens deste filme revelam-se verdadeiros cinéfilos: o mau é um grande fã de «Speed», como se pode constatar a partir de metade do filme, e a simpática carteirista mostra já ter visto «Chungking Express» um bom número de vezes (curiosamente, ambos os filmes são de 1994).
Talvez seja preocupante que na Coreia do Sul se façam filmes com orçamentos cada vez maiores e que, na data de estreia, ocupem um número esmagador de ecrãs disponíveis, reduzindo o espaço para a diversidade de géneros e propostas, concentrando-se todas as atenções no "blockbuster" da semana, mas a verdade é que «Tube» acabou por desiludir nas bilheteiras locais, o que poderia ser um sinal de que as audiências preferem outro tipo de filme. Por outro lado, de acordo com Darcy Paquet, em Koreanfilm.org, «Taegeukgi» (2004), um filme de Kang Je-kyu, realizador de «Shiri», estreou recentemente num número recorde de ecrãs e está a ser um grande sucesso nas bilheteiras sul-coreanas.
A referência a «Speed» parece ter sido assumida pelo realizador e nada de mal quanto a isso. «Tube» é um filme competente, no que à elaboração e execução das cenas de acção diz respeito. Está repleto de perseguições, tiroteios e combates corpo a corpo, num desfilar de sequências que cumprem com aquilo que se propõem: entretenimento. Mas se o item entretenimento está preenchido, fica a faltar algo a que a maioria de nós costuma dar alguma importância: lógica e coerência. Mesmo não tendo nada contra exageros num filme-pipoca, é difícil de aceitar muitas das coisas que por aqui sucedem, por não se encaixarem no tom geral. Tenta-se fazer um filme de acção, sério, com laivos melodramáticos, reforçados no final (onde se anota o corte mais pronunciado com a mecânica do cinema de Hollywood), mas no meio disto temos de assistir a algumas sequências de acção verdadeiramente cartoonescas.
O filme arranca em força, com um aparatoso tiroteio, que não pode deixar de gerar sorrisos. Os vilões, em número reduzido, destroem tudo e aniquilam dezenas de polícias, sem deixar cair os óculos escuros ou permitir que a gravata se entorte. Para que sofram algum dano terá de entrar em cena o nosso herói, tipicamente "malcomportado", casualmente vestido e com a barba por fazer. Este verdadeiro revoltado contra o mundo e a sociedade, afogado em sofrimento desde que perdeu o amor da sua vida, dedica-se a perseguir Kang, para aplicar justiça e para se vingar.
O modo "Speed no metropolitano" ainda demora um pouco a chegar. Mesmo antes de embarcarmos num comboio desgovernado e pronto a explodir, já vimos o herói a saltar por entre carris e a sobreviver, limpando o pó dos ombros. Depois disso, ainda iremos vê-lo nada menos do que três vezes a saltar para o interior ou a cair de um comboio em alta velocidade, desafiando e rindo-se na cara das mais elementares leis da física. Depois de tais prodígios, tem de nos custar a engolir as necessidades melodramáticas do final, assentes num pressuposto técnico conveniente para o clímax de um filme de acção.
Já se escreveu nestas páginas sobre alguns bons "dramas de horror" e seria agradável listar um bom "drama de acção" – um filme construído com base nas costumeiras cenas de lutas corpo a corpo, perseguições, explosões, etc., mas que consiga, ainda assim, reter alguma capacidade para nos envolver emocionalmente. Aquilo que «Swiri» não conseguiu ser, apesar de se ter esforçado. Não é certamente esse o caso de «Tube», onde o drama passa ao lado e se dispensaria a escolha, para interesse romântico, de Bae Du-na, fora do seu meio natural – filmes mais modestos em termos de orçamento, mas mais ambiciosos em termos artísticos, como «Barking Dogs Never Bite» (2000) ou «Sympathy for Mr. Vengeance» (2002). Bae tem uma certa tendência para participar em filmes que não funcionam bem nas bilheteiras, pelo que se espera que o facto de tal suceder também com um potencial blockbuster de acção não venha a contribuir para que estúdios e financiadores comecem a intervir, com sugestões alternativas de casting, nos seus projectos futuros.
[1] A legendagem inglesa opta por nomes ocidentalizados: o vilão é “T”, o herói é “Jay” e a personagem de Bae Du-na é “Kay”. |