Hsiao Kang (Li), um jovem desocupado, reencontra uma colega de escola (Chen), com a qual visita o local da rodagem do filme onde ela trabalha. A realizadora convence-o a substituir um manequim, pouco convincente como cadáver flutuante no altamente poluído Rio Tanshui. No dia seguinte, Hsiao padece de uma forte dor no pescoço. Separadamente, apresentam-se mais dois personagens centrais: um homem (Tian) que frequenta as saunas gay de Taipé em busca de anónimos encontros sexuais e uma mulher (Lu), ascensorista, com um amante que pirateia filmes pornográficos.
N' «O Rio» há um conflito entre a potencialmente interessante temática de desenvolvimento e uma forma de filmar (ou de montar) que caminha lentamente para o mesmo mal de que padece Hsiao Kang; "pain in the neck". São-nos apresentados três personagens, todos eles com falta de sintonia com o meio que os circunda e em contínua busca por alguma forma de satisfação física. Demora algum tempo até que as relações entre eles sejam explicadas ao espectador.
Hsiao não procura nada em particular. Não parece trabalhar e vagueia sem destino na sua scooter. A mulher busca as carícias de um pornógrafo que a ignora, sobre o som de prazer simulado, proveniente de vídeos pornográficos a serem duplicados. Os constantes encontros sexuais do homem, nas saunas ou com "rapazes de aluguer", não lhe trazem qualquer satisfação. O isolamento, a solidão e a indiferença dos personagens percorre o filme, e Ming-Liang deixa a câmara a observar tudo em planos médios, evitando a intimidade do close-up. Todos os planos parecem durar três vezes mais do que o tempo necessário, para intensificar o aborrecimento sentido (e possivelmente também para que o espectador possa partilhar esse sentimento). A dada altura até o operador do microfone parece quase adormecer por detrás de uma porta.
A água é o símbolo essencial, algo que o título começa por sugerir. Símbolo da vida, do fluir, mas também dos acidentes de percurso (a água no corpo de Hsiao, a inundação no quarto). Símbolo também sexual (fluidos corporais), num filme em que nenhum personagem obtém qualquer laivo de verdadeira satisfação. Uma cena de sexo (heterossexual) prolonga-se invulgarmente (para sexo cinematográfico, entenda-se), invariavelmente, não se distinguido dos demais planos "aborrecidos", de forma que o prazer físico parece ser um mero efeito secundário de mais um momento de frustração.
«O Rio» surge na continuidade dos dois filmes anteriores de Ming-Liang Tsai, com os quais partilha os temas (e, aparentemente, actores e personagens), sendo parcialmente baseado em experiências reais. O caso do corpo no rio, por exemplo, foi inspirado numa situação em que Ming-Liang teve de convencer um amigo a fazer o papel de Kangsheng no filme-dentro-do-filme (o qual adoeceu e ficou aborrecido quando essas imagens não foram usadas na versão final). Já a dor no pescoço terá sido retirada de um acidente com o mesmo actor durante a rodagem do primeiro título desta "trilogia", «Qing Shaonian Nezha/Rebels of the Neon God», em que se teve de recorrer a igual método de "suporte de pescoço", para a condução de uma scooter.
Infelizmente, apesar de ser um daqueles filmes que fornecem tópicos para animadas discussões, devido à lentidão com que as suas duas horas de duração se desenrolam, «Heliu» não é de forma alguma recomendado a espectadores que não tenham o sono em dia.
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