Depois de vários anos sem conseguirem ter filhos, Mi-sook (Shim) e Do-il (Kim) decidem adoptar uma criança. Por razões práticas e convenientes ao guião, escolhem um miúdo já com seis anos, depois de Mi-sook ver alguns dos seus desenhos no orfanato. Poucas pessoas ficariam com o imediato desejo de adoptar uma criança de tenra idade que fizesse desenhos similares a "O Grito" de Edvard Munch, mas estamos perante um casal sensitivo e culto. Jin-seong (Mun) começa a revelar-se uma criança problemática: gosta muito de árvores e convive bastante com a acácia ressequida que está no quintal, convencido que ali está o espírito da falecida mãe. Os novos pais é que não ficam satisfeitos com a transferência de afectividade para um vegetal e a recém-formada família enfrentará problemas sérios, agravados pela chegada de inesperadas boas novas.
«Acacia» marca a segunda presença de um filme de Park Ki-hyeong no Fantasporto, depois da projecção, em 2001, de «Whispering Corridors» (1998), integrado numa retrospectiva de cinema coreano contemporâneo [vd. texto]. A relativa convencionalidade desse filme e a generalizada má recepção crítica de «Acacia» sugeriam ir com expectativas muito baixas para o visionamento, algo que vem já na sequência de o ter pura e simplesmente evitado em Sitges, dando preferência a outra opção de programação. Mas, afinal, «Acacia» não me pareceu tão mau como o pintavam. Entende-se que seja um filme mal amado, pois não traz nada de particularmente novo, reciclando, aqui e ali, expedientes vistos e usados no cinema de género. A utilização da árvore poderá constituir uma certa originalidade, mas convenhamos que a silhueta escura, sob a chuva, recortada por ocasionais relâmpagos, pode ser um bom contributo para a atmosfera de um filme, mas dificilmente poderia ser a principal fonte do horror. Não imaginaríamos a árvore a andar por ali com uma lâmina afiada, pronta a ser usada no pescoço das personagens, nem esperaríamos que tivesse um comportamento inspirado em «The Evil Dead» (ainda que tal talvez não tivesse sido totalmente posto de parte por Park); pelo menos não no contexto de um filme que tenta colocar o assento tónico no drama de uma jovem família.
A acácia ocupa uma posição central no cenário, para onde as acções e personagens confluem, mas o realizador teve o bom senso de desenvolver outros ramos do argumento, construindo uma narrativa de mistério, que arranca a partir do meio do filme, e criando conflito e tensão entre o casal. Assim, se existem momentos "assustadores", como uma flor da árvore a cair em slow motion (o que irá acontecer...?), a partir de certa altura não é o sobrenatural ou a respectiva sugestão ou ameaça, que sustém o filme, mas o drama que se desenrola no interior do lar (figurativamente falando, já que algumas das cenas mais importantes passam-se sob a árvore e sob a incontornável chuva nocturna).
Falta a «Acacia» uma melhor eficácia na gestão do drama que assola o casal, retirando-se importância à árvore (se fosse eliminada de todo não faria falta, requerendo-se apenas desencantar outro título para o filme). Acabamos por ficar com duas sequências de acontecimentos que parecem pertencer a filmes diferentes, sobretudo porque a presença da acácia e a sua intervenção como "personagem" não são suficientemente justificadas pelo texto, ainda que, a início, se sugira que será o cerne da história. No final, fica-se por pouco mais do que um elemento estético (a propósito, o poster afixado no Rivoli parece-me um verdadeiro “spoiler”, mas felizmente existem outros).
Park Ki-hyung filma de modo muito pouco “moderno”, com a câmara a aproximar-se das personagens, a custo, traçando linhas enviesadas, como se arrastasse um grande peso atrás de si e precisasse de contornar obstáculos. Evitou-se a facilidade da utilização da steadycam e dos zooms, criando uma proximidade mais orgânica com as personagens. Tal característica aliada a uma boa fotografia e ao design de algumas cenas – como a lã vermelha que preenche completamente um quarto, a determinada altura – permitem elevar a apreciação de um filme relativamente convencional e preso a fórmulas. O som também é usado para bom efeito, aparte algum overacting.
A conclusão dramática peca por ser demasiado repetitiva. A montagem é eficaz, mas requeria-se contenção em vez de se bater demasiadas vezes na mesma tecla (a tragédia, o drama); a persistente confrontação entre presente e um passado recente a preto e branco diluem, em vez de concentrar, o impacto do momento. Afinal, interessa apenas um facto e a adição progressiva de pormenores, através das várias revelações, raia o redundante.
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