Dai Si Gin/Breaking News
大事件 (dà shì jiàn)
Realizado por Johnnie To Kei-fung
Hong Kong, 2004 Cor – 89 min. Anamórfico.
Com: Richie Ren Xianqi, Kelly Chen Wai-lam, Nick Cheung Ka-fai, Hui Siu-hung, Lam Suet, You Yong, Ding Hai-feng, Li Hai-tao, Simon Yam Tat-wah, Maggie Siu Mei-kei
crime acção
Capa DVD
Uma operação policial de vigilância a um grupo de criminosos que preparava um assalto corre mal. O confronto entre os agentes da lei e os criminosos é registado por câmaras de TV e máquinas fotográficas. As chefias policiais discutem a humilhação e perguntam-se como conseguir recuperar a confiança da população e fazer passar a mensagem que Hong Kong ainda é um território seguro. A inspectora Rebecca (Chen) avança com uma ideia inovadora que acaba por ser aprovada: a polícia organizará uma operação de localização e captura dos criminosos que será filmada de acordo com um guião e montada do modo que melhor fizer transparecer a competência dos agentes da Lei. Os media ficam à distância e é a polícia que dirige as operações e o noticiário. Isolados num edifício, os fugitivos — provenientes do continente chinês — não parecem preocupados e revelam-se preparados para reagir e resistir às investidas policiais em ambas as frentes.

«Breaking News» passou por Cannes fora de competição onde foi melhor acolhido pela imprensa nacional acreditada do que o Grande Prémio do Júri — «Oldboy», de Park Chan-uk. Johnnie To Kei-fung mantém uma produção de dois ou três títulos por ano — uns mais comerciais, outros mais pessoais —, voltando agora a um registo mais do agrado de todos os que seguem a carreira do realizador de Hong Kong pelos seus policiais negros, que constituíram as obras mais características da Milkyway Image a partir de 1996, antes da abertura a projectos mais mainstream.

Chen Polícia
Rebecca (Chen Wai-lam) é a realizadora da operação de captura dos criminosos.

«Dai Si Gin» ("grandes eventos") é, em certa medida, uma reformulação de um filme anterior cuja temática foi insuficientemente ou defeituosamente explorada: «Expect the Unexpected» (1998). Essa obra — assinada por Patrick Yau Tat-chi, mas com paternidade assumida por To —, revelou-se demasiado próxima do conceito de subversão das expectativas da audiência, sem conseguir convencer plenamente da naturalidade do "inesperado" a que o título internacional se refere. Os criminosos assumem posições similares nos dois filmes, mas em «Breaking News» ficaram de fora os "continentais campónios", peça essencial do desenvolvimento narrativo de «Expect the Unexpected»; os imigrantes aqui são experientes e inteligentes o suficiente para fazer frente à polícia. Este é também um filme mais "limpo", onde os vilões não praticam os actos viciosos que vemos — ou dos quais tomamos conhecimento — no título de 98, nem a atmosfera é tão negra. As semelhanças confinam-se à estrutura narrativa, aos cenários, ao motor dinâmico da acção (criminosos preparam um golpe; polícias procuram-nos pela cidade), mas o desenvolvimento é diverso. Num filme To explorou o “inesperado”, aqui o “McGuffin” é um olhar mordaz sobre a voracidade dos media e o controle da informação que chega aos nossos lares.

Ren Chen-Cheing
O líder do gang (Ren Xianqi) ganha pouco stress com a aproximação das forças policiais. À direita: acção em split-screen.

Com uma duração contida nos 90 minutos, o filme de To é, antes de mais, um exercício de estilo e a exploração de um tema à volta de um texto espartano, sem perdas de tempo com floreados. O plano inicial, com a câmara a descer do céu e a introduzir os créditos é um exemplo disso. O plano permanece sem interrupção durante quase sete minutos, altura para a apresentação das personagens principais e para se fazer soar o tiro de partida que dá início à competição. A câmara volta a subir e a descer, vira-se para um lado e para outro, contorna as personagens, entra por uma janela de um edifício. Podemos imaginar o inferno que foi coordenar e iluminar este plano-sequência, com inúmeros actores e figurantes, que não aparenta manipulação ou colagens disfarçadas (aparte um jornal que cai estrategicamente sobre o pára-brisas de um carro e que “voa” com a ajuda de um fio, removido digitalmente).

À janela Cheung
O confronto prolonga-se dentro de um edifício.

To e os argumentistas não procuraram ser profundos na abordagem do tema — ou se procuram não são especialmente felizes —; o guião é o sustentáculo de um filme de acção, eficaz e escorreito, e, a esse nível, o resultado é muito satisfatório. O comentário à relatividade da informação que nos chega está lá, mas não se apresenta particularmente impressionante ou incisivo. Todos sabemos que aquilo que vemos no noticiário pode não corresponder inteiramente à verdade e conhecemos escândalos resultantes de notícias inventadas por jornalistas, embaraçando os meios de comunicação respeitáveis para os quais trabalhavam. Para apreciar o filme exige-se a suspensão da descrença no ponto fulcral que é a sua premissa. E quanto a isso, estamos, em grande medida, no campo da fantasia. As possibilidades da polícia filmar uma operação nestes termos é improvável, sobretudo porque chamaria a atenção dos próprios media durante a perseguição e cerco aos criminosos, sem que se pudesse prever como as coisas iriam terminar. Isto é, a operação mediática controlada por forma a limpar a imagem da polícia só faria sentido depois de capturados os criminosos, apresentando o material depois dos factos consumados. O risco seria demasiado. Mas é claro que dessa forma não teríamos «Breaking News».

Media
A natureza do filme não deixa espaço para uma relevante dimensão dramática das personagens. Não nos é dito quase nada sobre elas: estão ali e pronto. De certa forma, ainda bem; mais meia hora e tentar tornar o filme mais “sério” ou “profundo” poderia arruinar o ritmo e estragar um bom filme de acção. Os actores não têm espaço para deixar marca na nossa memória com as suas prestações: Richie Ren («Fly me to Polaris»), Kelly Chen («Infernal Affairs») e Nick Cheung são competentes e nada mais. Nos secundários encontramos vários habitués dos filmes de To, como Lam Suet e Hui Siu-hung, além das “guest stars” Simon Yam e Maggie Siu — duas presenças do excelente «PTU»

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Menu DVD
A Mega Star disponibilizou um DVD com uma óptima transferência anamórfica e som Dolby EX e DTS ES. Nada de muito importante a nível de extras: uma cena apagada, aparentemente destinada à versão alternativa para o continente chinês, um Behind the Scenes insignificante, de apenas 3 minutos (apenas legendado em chinês) e o trailer. Acrescem trailers para «The Eye 2» e «Xanda». Nota negativa para a caixa de cartão dificílima de abrir. Mas, pelo menos, tem duas versões do poster, uma de cada lado (ver acima).

publicado online em 8/8/04

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