Waniwa Junha [Wanee & Junha]
Wanee and Junha
와니와 준하
Realizado por Kim Yong-gyun
Coreia do Sul, 2001 Cor – 111 min.
Com: Kim Hee-sun, Cho Jin-mo, Cho Seung-woo, Choi Kang-hie
drama romântico romance
Capa DVD
Wanee (Kim) trabalha num estúdio de animação. Junah (Cho Jin-mo) tenta afirmar-se como guionista de cinema. Os dois vivem juntos há um ano. A relação é posta à prova pelo stress derivado dos projectos pessoais e dos horários que nem sempre permitem que passem tempo juntos, mas também pela a eminência da visita do meio-irmão de Wanee, Yeong-min (Cho Seung-woo), que esteve alguns anos a estudar no estrangeiro. As conturbadas relações familiares de Wanee são ilustradas através de uma série de flashbacks.

«Wanee & Junah» é um filme que muito dificilmente poderia ser recomendado com base na mera descrição do argumento, algo que certamente transparecerá na sinopse precedente. É verdade que o texto não é propriamente original, nem acontece muita coisa, durante as quase duas horas da sua duração, que justifique encher muitas linhas com o intuito de situar o leitor. Trata-se de um filme que assenta nas personagens e não no texto, pelo que a sua apreciação deriva sobretudo de duas coisas: a qualidade do guião e a credibilidade das representações. A primeira vertente não decepciona. A estrutura não é inovadora nem o pretende ser; parte-se de uma situação presente e recorre-se a vários flashbacks que vão delineando a situação emocional da personagem central, Wanee. Tudo se desenvolve em redor dela e Junah quase se reduz a um "interesse romântico"; o filme não nos mostra muito sobre o seu passado ou sobre a sua família — a sua presença no filme reconduz-se à ligação com Wanee. Ele é importante para o filme, por ser importante para ela.

No que toca ao trabalho dos actores, não há muito por onde nos queixarmos, antes pelo contrário; ainda que não haja azo a grande amplitude emocional, Kim e Cho encarnam na perfeição as duas personagens. A subtileza e o registo relativamente low profile permitem acentuar os breves momentos em que se exige mais dos actores, como a cena do post-it (tm) no frigorífico. O filme é praticamente construído a dois, ainda que pontuado por alguns episódios com outros intervenientes, sempre em dependência do casal, como Su-yang (Choi), a amiga de infância de Wanee, e Yeong-min ou o colega de trabalho dela, também com uma relação em crise.

Kim Cho Cho Kim
Wanee e Junha em crise. À direita, Su-yang visita Wanee.

Alguns temas sensíveis no contexto de uma sociedade confucionista, marcadamente conservadora, são abordados sem que para eles se chame demasiado a atenção, como se se tratassem de factos incidentais no percurso de um plano narrativo superior: união de facto, relações homossexuais e incesto (ou meio-incesto...), ainda que se fique pela sugestão e seja tratado com uma certa candura naïf, que chega a ser tocante, ao ponto de provocar redundâncias da escrita. A desagregação da família nuclear tradicional (uma expressão que, de tão usada, merece um acrónimo próprio: DFNT) é um tema central a esta obra, ainda que o realizador e argumentista, Kim Yong-gyun, a deixe ficar subtilmente nos bastidores, enquanto desenvolve uma história de amor, desenrolada ao contrário daquilo que é mais normal no género, i.e., aqui a situação está estabelecida e o que está em causa não é saber se o casal central se junta, mas se a relação se consegue suster (ou se o presente pode sobreviver ao passado). Uma perspectiva talvez pouco "comercial", o mesmo se podendo dizer do modo como se evita seguir convenções; seria de esperar, por exemplo, que se optasse por um conflito entre o casal, à medida que ele era forçado a lidar com o passado dela, mas o texto de Kim, mantendo-se simples, foge às necessidades de se confinar a tais parâmetros pré-determinados.

Kim Kim

Dois segmentos de animação envolvem a narrativa principal, a abrir e a encerrar o filme. Não é muito importante saber se foram originados naturalmente devido ao trabalho da personagem principal ou se ela foi concebida como animadora porque os cineastas desejavam inserir segmentos animados. A animação apresenta uma pequena história paralela e a técnica empregue é a da rotoscopia, isto é, tem-se como base imagem real, posteriormente "coberta", o que resulta, naturalmente, numa representação bastante realista do movimento das personagens. Houve quem comparasse a técnica a «Waking Life», de Richard Linklater, mas a única semelhança é a técnica-base, isto é, a captação de imagens com uma câmara, uma vez que aqui o efeito que se procura não é de abstracção ou experimentação estética, mas de relativo realismo.

Kim Cho animação

«Wanee & Junha» é mais um drama romântico produzido na Coreia do Sul que resulta (ainda que não tenha sido muito bem sucedido comercialmente), devido à sensibilidade e sinceridade que investem a construção das personagens e a recusa em recorrer a artificialismos ou a quaisquer técnicas narrativas destinadas a apimentar o texto ou a provocar reacções forçadas no espectador. É inegável que o filme se sustém na presença de Kim Hee-sun, que terá aqui provavelmente o seu papel mais relevante, no contexto de uma breve carreira constituída por papéis que pouco mais exigiam que a sua fotogenia; «Jaguimo» [«Ghost in Love»] (1999), «Calla» (1999) ou «Bichunmoo» (2000).

4
DVD editado na Coreia do Sul pela EnterOne (R3), imagem anamórfica e som Dolby Digital 5.1, servido por alguns extras interessantes que se apreciam bem sem legendagem, como a captação de imagem para posterior animação e a respectiva ilustração das várias fases do processo. Inclui ainda cenas apagadas e making of. Boa qualidade genérica e uma excelente compra, principalmente a preço promocional. Como muitos outros DVDs coreanos apresenta uma ligeira flutuação vertical na imagem (provavelmente imperceptível para a maioria dos espectadores) em mudanças de planos.

publicado online em 2/11/03

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