Yeopgijeogin Geunyeo [My Sassy Girl]
Yupgi Girl
엽기적인 그녀
Realizado por Kwak Jae-yong
Coreia do Sul, 2001 Cor – 137 min./122 min.
Com: Jeon Ji-hyeon, Cha Tae-hyeon, Yang Geum-yong, Song Ok-sook, Han Jin-hee, Kim In-moon, Kim Il-woo
drama comédia romance
Poster
Kyun-woo (Cha), o narrador, volta ao lugar onde, há dois anos, foi enterrada uma “cápsula do tempo”. Ele combinou encontrar-se ali com “Ela” (Jeon). No metropolitano, dois anos antes, ao fim do dia, o jovem estudante universitário cruza-se com uma jovem num estado de embriaguez lamentável. As circunstâncias vão levar a que passem muito tempo juntos, apesar da personalidade dominadora e abusiva dela, tornando-se “uma espécie de” namorados. A início, Kyong-woo quer apenas ajudá-la a curar a mágoa que julga ver nela, libertando-a das memórias de um passado doloroso, mas a relação entre os dois parece fortalecer-se gradualmente.

A curta sinopse pode sugerir o contrário, mas «My Sassy Girl» é realmente, na sua essência, uma comédia, e um produto cinematográfico muito bem sucedido no que a isso diz respeito. Mas não é uma comédia vulgar. Desde logo, porque tem perto de 2 horas e 20 minutos, na sua versão “Director's Cut”, ficando-se ainda pelos 120 minutos na versão previamente lançada em salas de cinema na Coreia do Sul e em outros territórios asiáticos. Por outro lado, sendo um filme ao qual eu não tenho qualquer pejo em aplicar o adjectivo “brilhante”, é constituído por um conjunto de pequenas situações que quase poderíamos definir como lugares-comuns, o que só prova que com bons diálogos, boa direcção e bons actores que dão vida às personagens, o mesmo material-base pode dar origem a uma nulidade ou a um filme fascinante que nos dá vontade de ver, rever e comprar posters e t-shirts (bom, pelo menos, de ver e rever). O sucesso do filme foi também comercial, colocando-se no top de bilheteira de 2001, na Coreia do Sul, logo abaixo do filme mais lucrativo de sempre no território: o blockbuster «Chingu» [Friend].

Kyun-woo conhece uma rapariga estranha (e um pouco alcoólica).
Poderá ser o caso de, como dizia uma senhora no King, durante a projecção de «Yi Yi», “ah!, os orientais são muito sensíveis!”, ou poderá apenas tratar-se do facto de estarmos no âmbito de cinematografias que ainda conseguem respirar naturalmente, sem estarem apertadas pela ditadura dos gostos médios, que podem ter mais que ver com o que estúdios pensam que o público quer, do que propriamente com os gostos desse público (como se todo o público quisesse sempre ver o mesmo filme), mas o facto é que da Coreia do Sul vão saindo filmes que vão surpreendendo e fidelizando audiências – mesmo pelo Ocidente, apesar das estreias comerciais serem raras –, dado terem compromissos apenas com uma boa história e não com listas pré-definidas de requisitos. Bem, na verdade, nem tudo é um mar de rosas, pois, infelizmente, o sistema de produção e exibição na Coreia do Sul força a generalidade dos filmes a ficarem-se por uma duração de 120 minutos (mais exigentes que a duração “normal” máxima de um filme de Hollywood), daí a montagem original de cinema de «My Sassy Girl» ter sido mais curta em 17 ou 18 minutos.

Cha, Jeon
Cha Tae-hyeon (Kyun-woo) e Jeon Ji-hyeon (a rapariga).
Como acima se refere, «My Sassy Girl» contém ingredientes com os quais estamos familiarizados de outras obras, em particular em filmes de género (comédia romântica, assim se rotule por ora): um casal que se encontra em circunstâncias invulgares, que anda ás turras durante algum tempo, passam por dificuldades, momentos alegres, momentos tristes, etc. e tal. Kwak Jae-yong explora muito bem as situações humorísticas que constituem a parte substancial da narrativa, onde se incluem alguns quadros algo extremados e até mesmo caricaturais. É difícil que um simples texto convença alguém desse facto, mas entre os momentos mais marcantes incluem-se as reacções agressivas d' “Ela” contra o pobre Kyeon-woo, que, apesar de nem sempre se portar correctamente, é muito bom rapazinho (só devia era visitar a tia mais vezes, para fazer a mãe feliz). As “sinopses” por Ela escritas são um dos meios de rechear a história com pormenores extra, e de mudar o registo, nunca nos deixando cair no aborrecimento; assim temos direito a umas cenas de acção pós-modernas, a mais um pequeno “spoof” a «Ashes of Time» de Wong Kar-wai e à rescrita – verdadeiramente hilariante – do clímax de um clássico da literatura coreana, que, segundo se diz, tem um papel importante na formação dos adolescentes e constitui a razão porque os coreanos preferem dramas a filmes de acção.

ID
"Liceais", mas com idade para beber álcool.
Chega agora o momento de negar parcialmente o que acima escrevi (não se pode confiar em ninguém!), porquanto «My Sassy Girl» extravasa abundantemente o epíteto de comédia – porque no “prolongamento” já não é o riso que nos prende ao filme – romântica – porque o contacto físico entre o casal é quase inexistente (para lá da violência, claro). Acresce a ausência de video-clips de dois minutos com qualquer consumação física do enlace, sendo difícil, inclusive, definir o estatuto da própria relação. Perto do final, estamos perfeitamente agarrados ao percurso das duas personagens e angustiados com a resolução que se vai anunciando. Não há sentimentalismo gratuito, nem lições de moral a “resolver” (ou a negar) tudo o que esteve para trás, como por vezes sucede em comédias-tipo norte-americanas, depois de soar o apito que diz que é tempo de acabar com o humor e despachar a lição de moral antes dos créditos rolarem. O "prolongamento" é naturalmente emocional, sem adição de corantes ou conservantes.

Com uma duração anormalmente longa, para uma obra que começa em tom ligeiro, «My Sassy Girl» está temperado com algo mais do que gags humorísticos. Pode-se exemplificar com a referência aos viajantes no tempo (todas as histórias que ela escreve têm uma protagonista que veio do futuro), que é desenvolvida de forma curiosa e, espantosamente, coerente, ou com pormenores como a imagem com os quíntuplos, que levará o espectador mais atento a tentar encontrá-los no leque das personagens secundários (não aparecem todos). O trauma do passado dela e o percurso de encontros e desencontros no presente com Kyeon-woo ilustram a questão filosófica que se coloca, por vezes, ao Homem: somos escravos ou donos do nosso destino? No final, tudo se ajusta quase matematicamente.

O trabalho dos dois actores, que sustêm o filme praticamente sozinhos, é excelente, sem contabilizar o grande sortido de caretas que têm de produzir. Jeon, que já havia chamado a atenção em «Il Mare» (2000), oferece-nos um delicioso leque de expressões faciais, comutando da sorridente menina, simpática e atenciosa, para uma verdadeira psicopata, cujos olhos parecem querer sair das órbitas. Doce e selvagem, entre um passarinho que se resguarda da chuva e um tubarão voraz.

Metro
É de notar que o material promocional do filme, trailers, fotos, etc., sugere tratar-se de uma comédia “teen” desmiolada, o que está muito longe da realidade, como já deverá ter decorrido da leitura das linhas precedentes. Prefere confiar num trailer ou neste texto? «My Sassy Girl» é um filme-culto instantâneo, bastando juntar alguns shots de Soju, até que deixemos cair a cabeça ruidosamente em cima da mesa. Bam! [N.b.: O excesso de bebidas alcoólicas é prejudicial à saúde.]

5

Disponibilidade: DVD coreano (Starmax, R3). Dois discos, um cheio de extras não legendados, mas ainda assim com algum interesse. A edição original vinha numa caixa metálica; a corrente traz uma caixa normal dentro de uma "slip case" de cartão. Saiu outra edição com o mesmo disco dentro de um "gift-pack". Infelizmente, a legendagem em inglês foi feita a partir da versão "script" da legendagem em coreano, o que requer um certo esforço de abstracção. Por exemplo:

Girl: (Girl starting to cry)
Huk~ huk~ huk~~~!

Este formato irregular de legendagem retém alguma utilidade, por exemplo, no caso em que nos informam que uma personagem usa um dialecto ou qual a música que estamos a ouvir. A maior parte das pessoas parece habituar-se depressa. Há um VCD em Hong Kong (Edko) com a versão de cinema. O DVD de HK, com legendagem normal, contém igualmente a versão mais curta, com as cenas extra apresentadas em separado. Os suplementos, um pouco diferentes da edição coreana, também não são legendados em inglês.

publicado online em 1/12/02

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