Assassina Nua/Chik Lo Giu Yeung/Naked Killer [en]
Naked Killers
赤裸羔羊 (chì luŏ gāo yáng)
Realizado por Clarence Fok Yiu-leung [Clarence Ford]
Hong Kong, 1992 Cor – 93 min.
Com: Chingmy Yau Suk-ching, Simon Yam Tat-wah, Carrie Ng Ka-lai, Yiu Wai [Kelly Yao], Svenwara Madoka [Sugawara Madoka], Hui Siu-hung, Lau Dik-ji, Ken Lo Wai-kong
crime comédia romance sexploitation trash kitsch
Capa DVD
Uma série de homicídios violentos intriga a polícia de Hong Kong. As vítimas, do sexo masculino, são encontradas num estado lastimável, com membros partidos e sinais de mutilação genital. Ti-nam (Yam) suspeita que o assassino é do sexo feminino, mas, tendo em conta a brutalidade das cenas do crime, os superiores não o levam a sério. Como poderia uma menininha deixar um homem saudável e atlético em tal estado? Ti-nam tem um trauma: depois de ter sido responsável por uma morte acidental, não mais conseguiu empunhar a arma sem sentir uma indisposição incontrolável. Depois de presenciar a morte de uma pessoa próxima, Kitty (Yau) parte para a vingança. Conhece uma mulher misteriosa chamada Cindy (Yiu), que se revela uma assassina a soldo e que a treina como sua nova discípula. A antiga aluna da "Irmã" Cindy, Princesa (Ng), trabalha agora por conta própria, assistida pela sua amante, Baby (Svenwara). O conflito entre as duas é inevitável, mas Princesa parece indecisa entre matar Kitty ou seduzi-la.

«Naked Killer» é um marco representativo do dinamismo e vivacidade que caracterizou o cinema de Hong Kong das décadas de 80 e 90, reunindo um conjunto de ingredientes apelativos, misturados sem preocupações com subtilezas, porque o tempo é curto e há mais filmes para fazer na semana que vem. O mote poderá ter sido «Basic Instinct», realizado no mesmo ano, de onde se aproveitou o muito familiar elemento “assassinas lésbicas em danças sensuais sob luzes de discoteca, que atraem homens para o leito, para aí os eliminar barbaramente”. Mas se o filme do realizador holandês recorreu a um picador de gelo durante o acto sexual (símbolo da penetração devolvida), em «Naked Killer» as assassinas (muito castas), não parecem interessadas em deixar as suas vítimas ir tão longe, optando frequentemente por lhes remover, violentamente, a masculinidade. Aqui deixamos para trás a vertente thriller de mistério e seguimos um certo modelo de filme de acção, retemperado com fortes pitadas de glamour sexploitativo: trata-se certamente também de um filme erótico, que não envereda propriamente pelo esquema rotineiro de cenas de sexo inseridas ao longo da narrativa.

Yau
Kitty (Yau), à esquerda, assume uma nova identidade. À direita, a Irmã Cindy partilha um momento de descontracção.

Fok explora a sensualidade e o glamour — sem se preocupar em limites no “bom gosto” ou no kitsch, algo notório no guarda-roupa das actrizes e na cenografia — concentrando os momentos mais quentes e explícitos numa cena que entrecorta Tin-am com Kitty e a Princesa com a sua Baby (que nomes, que nomes). A actriz japonesa Swenwara Madoka (Gaan Yuen Daan, lendo os caracteres em cantonês) foi provavelmente contratada para compensar o facto de Yau e Ng não estarem interessadas em apresentar nudez “relevante” perante as câmaras (veja-se a "naturalidade" com que se cobrem). Anota-se a apresentação de uma das cenas de masturbação mais ridículas jamais filmadas, novamente com a intercalação entre personagens separadas no espaço e em jeito de video-clip.

A violência levou a que a versão original de Hong Kong tivesse sofrido uma série de cortes. Ironicamente, esta versão foi editada no Reino Unido (M.I.A.) sem cortes adicionais pelos censores e promovida como "The Complete Uncut Version", saindo também em DVD pela Mei Ah. Posteriormente, o filme foi lançado na versão integral pela Mega Star, sendo a mesma montagem que figura no mais recente DVD britânico da Hong Kong Legends. Esta versão apresenta mais meia dúzia de cenas, incluindo mais alguma violência e salpicos de sangue, tendo também a enorme benesse de já não apresentar os bleeps que surgiam na banda sonora, quando se pronunciava um termo em calão para “pénis”.

Duas viciosas amantes assassinas: Princesa e Baby.

Wong Jing, produtor e argumentista, é conhecido pelo baixo nível moral das suas produções, não se coibindo de apresentar violência sexual em forma de entretenimento. Tal não é propriamente raro no cinema para adultos produzido em Hong Kong, mas o modo como o sexo e a violência são retratados em «Naked Killer» quase poderia convencer-nos de que se trata de um filme feminista. Não nos enganemos, porque Wong aponta sobretudo para uma audiência masculina que gosta de ver mulheres esbeltas com pouca ou nenhuma roupa, adicionando alguma provocação com o terror causado pelos actos emasculatórios. Ainda assim, as heroínas dominam realmente o elenco masculino, totalmente secundário e secundarizado, com excepção do "protagonista", interpretado por Simon Yam. Mas que protagonista... Ti-nam não consegue empunhar a arma devido a um trauma e, numa simbologia muito, erm, subtil também sofre de impotência. Não dispara de modo algum. Ou... agarra na arma, mas não a consegue disparar. (Outra subtileza está no próprio nome Ti-nam 铁男, que significa, literalmente, "homem de ferro.) O domínio feminino é também ilustrado pelos servos da Princesa, que não servem para nada senão para a rodearem ou para serem baleados quando chega a altura de haver alguma acção, respondendo sempre afirmativamente a todos os vilipêndios da patroa.

«Naked Killer» é trash, kitsch e exploitation e não pretende ser senão um objecto de entretenimento sem réstia de seriedade ou preocupações com conceitos de moralidade. Poucos pretenderão fazê-lo passar por “arte”, mas menos ainda esperarão encontrar densidade intelectual num filme cuja premissa envolve assassinas lésbicas, com nomes como Princesa e “Gatinha”, pouco vestidas e perseguidas por um polícia que não consegue disparar.

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Editado em Portugal na colecção CineÁsia da Prisvideo, em Setembro de 2005. Disponível no RU via HKL. Saíram várias edições em Hong Kong em DVD. A caixa especial da M.I.A. trazia uma cassete (versão original de HK, com cortes), postais com imagens promocionais e um livrete de 16 páginas com o Top 10 das “Deadly China Dolls”. A cassete inclui também uma entrevista com Wong Jing e Yam Tat-wah e o trailer original (é verdade, antes do DVD já havia extras). (25/09/05)

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publicado online em 5/07/03

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