Ju-on: a maldição de alguém que morre vítima de raiva violenta. Ganha força e produz efeitos nos locais onde essa pessoa viveu. Aqueles com quem se cruza morrem e uma nova maldição nasce [texto de introdução do filme].
Harase Kyoko (Sakai), famosa actriz de filmes de horror, é convidada para participar num programa de TV que visita uma casa com fama de estar assombrada. A presença da equipa de televisão na antiga residência da família Saeki vai renovar a maldição. Uma a uma, as várias personagens vão sendo visitadas pelos fantasmas de Toshio (Ozeki) e Kayako (Fuji).
Um filme de horror popular que se preze não pode deixar de ter uma sequela, um ou dois anos depois. «Ju-on» teve origem na televisão, meio para o qual foram produzidos dois filmes, sempre com direcção de Shimizu Takashi e com alguns dos mesmos actores das obras para cinema (o miúdo não — deve ter crescido depressa demais). Uma das novidades do remake em língua inglesa é tratar-se de uma co-produção, com a realização de Shimizu, mantendo-se igualmente os fantasmas japoneses (não são muito faladores, de qualquer forma), Fuji Takako (a mulher) e Ozeki Yuya (Toshio, o miúdo), agora a aterrorizarem um elenco ocidental, encabeçado por Sarah Michelle Gellar. Com a bênção de Sam Raimi e pela mão de Roy Lee, um senhor que ganha milhões a “descobrir” filmes na Ásia e a vendê-los a Hollywood para os refazer em inglês, em versão baixas calorias e de preferência “PG-13”.
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Kyoko (Sakai Noriko) é convidada especial de um programa de TV que decide visitar a casa assombrada dos Saeki. |
«Ju-on 2», mais que continuação é a continuidade quase plena do filme anterior. Nem sequer se tenta introduzir algo particularmente novo em relação ao "original". Arranca-se com a repetição da definição de “ju-on” no início do filme, mantém-se a estrutura narrativa, na forma de meia dúzia de segmentos, separados pelo nome de uma personagem — Kyoko, Tomaka, Megumi... Por outro lado, há uma tentativa de replicar e ampliar distorções cronológicas que acaba por prejudicar seriamente o impacto do filme. Em «Ju-on», a sequência de segmentos não era cronológica, retrocedendo-se no tempo ou voltando a acontecimentos já vistos para seguir caminhos paralelos. Shimizu manipula a cronologia de forma que acaba por se revelar gratuita e exagerada. Mais do que isso, não se entende a necessidade de, dentro do mesmo segmento, apresentar distorções temporais, em que uma personagem vê algo que aconteceu noutro momento do tempo. A intenção é tão só de provocar reacções de surpresa, umas atrás da outras, e decorre do Síndrome da Sequela, de pegar nos mesmos ingredientes do original, apresentando-os de forma diferente. Se em «Ju-on» duas personagens se encontravam, como que através de um portal temporal, separadas por 10 anos, no segundo filme, há encontros imediatos com mortes próximas que estão por advir nos próximos dias.
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Como um vírus, a maldição espalha-se. Está algo na parede! Está algo na fotocopiadora! |
Os fantasmas do primeiro filme continuam presentes. A sua motivação é fundamentalmente a vingança, resultante da morte violenta que sofreram, sem que se gere qualquer ressonância emocional, já que não estão a atacar alguém em consequência de ter construído uma casa em cima de um cemitério índio ou algo assim. Era assim no primeiro filme e nada se alterou. No entanto, agora o miúdo e a mãe parecem mais dedicados a perseguir toda a gente, a serem verdadeiramente chatos. Há a questão de uma gravidez que não parece ter muito sentido senão para conduzir a um final "chocante", que se revela, uma vez mais, gratuito. Ficamos por saber porque é que não lhes bastava atacar e/ou matar as vítimas; qual a função destes requintes "dramáticos" de malvadez?
«Ju-on» também não tinha uma linha narrativa forte, nem permitia que as personagens se desenvolvessem, mas a vertente formal e os mecanismos do horror tornavam-no um título minimamente apetecível. A sequela replica um texto vago e estratificado, a montagem é menos eficaz — o resto já conhecemos e pouco efeito pode reter.
Uma ligeira diferença em relação ao filme anterior é também a intervenção mais directa do Mal. Antes o horror surgia praticamente só pelo vislumbrar das criaturas e, sobretudo, pela antecipação da sua presença. Neste segundo tomo, aproximamo-nos perigosamente, se não do slasher, do filme de monstros convencional. Entende-se que os cineastas não quisessem simplesmente replicar os métodos do filme anterior, mas a conclusão a que chegámos é que o tema, as personagens de Toshio e Kayako e a estética não justificavam uma sequela e que esta se pôs de pé unicamente por razões comerciais, independentemente de um conceito e argumento que a justificassem. Já sabemos como a atormentada Kayako se move, já ouvimos os ruídos crepitantes, pelo que essas cenas não têm uma fracção do efeito do primeiro filme. Shimizu prolonga demasiado as cenas introdutórias e recorre a um esquema de sustos contínuos (aparecem, desaparecem, aparecem, desaparecem,...), antes que comece a acontecer de facto alguma coisa. Se alguém esperava algo do remake, talvez haja aqui justificação suficiente para baixar dramaticamente as expectativas.
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