Donggam [Ditto]
동감
Realizado por Kim Jeong-kweon
Coreia do Sul, 2000 Cor – 111 min.
Com: Yoo Ji-tae, Kim Ha-neul, Park Yong-wu, Ha Ji-won, Kim Min-ju, Sin Cheol-jin, Yu Tae-gyun, Lee In-ok, Lee Young-kwang
drama ficção científica romance
Ditto
Nota: apesar dos trailers, posters de cinema e capas de edições vídeo definirem desde logo determinado detalhe sobre o desenvolvimento do filme (que se pode considerar como parte da respectiva premissa), a verdade é que o argumento está escrito de modo a que tal apenas seja revelado ao espectador por volta de um terço da sua duração. Sendo certo que é quase impossível ver «Ditto» sem conhecimento desse facto, devido às necessidades de marketting, pareceu-me, ainda assim, que deveria tentar fazer um esforço para escrever o texto omitindo-o, algo que provavelmente será considerado, pela generalidade das pessoas que conhecem o filme, como uma extrema picuinhice. Por outro lado, quem não se preocupa tanto com esses pormenores pode seleccionar a área em branco na sinopse abaixo e assim aceder a uma descrição mais detalhada.

So-eun (Kim Ha-neul), uma tímida estudante de liceu, está apaixonada por Dong-he (Park), que reatou recentemente aos estudos, depois de ter cumprido o serviço militar. Entre tentativas de aproximação, visita a amiga Seon-mi (Kim Min-ju), que se encontra no hospital com uma perna partida. Inadvertidamente, So-eun acaba por tomar posse de um aparelho de rádio-amador (HAM). Certa noite, o aparelho começa a fazer estática e uma voz apela ao contacto. É assim que So-eun conhece In (Yoo), que afirma frequentar a mesma escola. Combinam um encontro a que ambos comparecem, mas sem que se cruzem um com o outro. So-eun, em 1979, fica surpreendida quando In afirma que o ano é 2000. Este facto inexplicável está na base das inter-relações que envolvem a vida de todos os protagonistas, onde falta incluir Hyun-ji (Ha), uma jovem um tanto ou quanto alcoólica, que aprecia a companhia dele, apesar de In a tentar afastar de modo por vezes rude.

Conhecendo-se via rádio e passando a falar regularmente, So-eun e In começam a partilhar experiências pessoais e a trocar conselhos sobre os problemas que os afectam. Mas, à medida que se vão tornando mais próximos e relatando mais pormenores das respectivas vidas privadas, começam a perceber que poderão existir relações, nem todas agradáveis, entre a vida de um e de outro.

Ditto
«Donggam» é mais um melodrama coreano de produção recente, que consegue, através de uma história simples e directa ao assunto, tocar a sensibilidade do espectador, sem recorrer a sentimentalismo barato. A história respira e desenvolve-se sobre um elemento de cinema fantástico, mas não se perde tempo a matutar sobre isso, nem o mesmo é usado para prosseguir uma estrutura de filme de ficção científica ou de fantasia. Dá-se por aceite, não se questiona e a sua função é de total submissão à história que se quer contar e à evolução das relações entre as personagens.

O que começa com a aparência de um convencional drama romântico ligeiro, apresentando, com algum humor, o relacionamento de So-eun com a amiga e o modo atrapalhado com que se tenta relacionar com o rapaz por quem está apaixonada (“rapaz” não lhe assenta muito bem, pois Park tem ar de quem passou mesmo muitos anos na tropa), caminha, à medida que mais revelações se vão dando a conhecer, para um reforço da intensidade dramática e para o desvanecimento geral dos sorrisos.

In Ha
In (Yoo) e Hyun-ji (Ha).
Aquilo que é mais marcante em «Donggam», é a ausência total de concessões, perante um caminhar para resoluções relativamente tristes e amargas, quando uma impiedosa ironia do destino condiciona o destino de uma das personagens. A vida, por vezes, é mesmo assim e não há nada que se possa fazer para inverter um destino que parece traçado. E se as coisas não fossem bem assim? E se tomássemos decisões diferentes? As coisas encaixam-se tão bem nesta sedutora obra coreana, que se torna difícil conceber uma conclusão radicalmente diferente. Há algo que se pode considerar como uma compensação; afinal nem todos podem ser envoltos pela frustração de não poder realizar os desejos mais profundos. Dentro de um mecanismo irreal, de ficção pura, o primeiro filme de Kim Jeong-kweon, consegue conferir uma sensação de extrema naturalidade, com personagens convincentes e reais. Há apenas um momento em que se poderia ter melhorado a caracterização física de uma delas, mas tal acaba por não interferir grandemente com a apreciação do filme.

O facto de In surgir como alguém que não atrai de imediato a simpatia do espectador, em particular devido ao modo como parece desprezar Hyun-ji, funciona também a favor da credibilização das relações aqui apresentadas, pois pode levar-nos a pensar, por exemplo, que há muitas bestas assim neste mundo. Por outro lado, veremos que tal característica do seu comportamento tem alguma complexidade e faz sentido no seio da narrativa, à medida que nos aproximamos da conclusão.

Kim Park
«Ditto» desenvolve-se sobre um fundo de acontecimentos importantes para a história recente da Coreia do Sul, nomeadamente a evolução lenta da ditadura para um estado democrático, que certamente serão melhor apreciados e digeridos pelo público local ou por quem tenha conhecimentos mínimos na matéria, mas o filme, no seu essencial, continuaria a funcionar em pleno, a ter a força emocional que revela, em particular com a troca de olhares e sorrisos, próximos do final, se o fundo histórico fosse diferente ou se ao mesmo não fosse dada particular importância. Faz uma boa sessão dupla com «Il Mare» de Lee Hyun-seung ou até, em crescendo, uma aceitável sessão tripla adicionando o japonês «Love Letter».

4

Disponível em DVD Coreano, formato original anamórfico, Dolby 5.1, legendas em inglês, com alguns extras (não legendados), como making of e entrevistas, além da banda sonora original (seleccionável, faixa a faixa, num menu). A qualidade da imagem não é das melhores, revelando artefactos digitais ao longo de todo o filme e alguma falta de nitidez.

publicado online em 1/12/02

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