Nong Toom (Suwan) sentiu-se, desde criança, uma mulher dentro de um corpo de homem. O seu jeito efeminado e a vontade de brincar com estojos de maquilhagem em vez de algo mais próprio para um rapaz traçaram-lhe uma infância e adolescência difíceis, mas viria a descobrir um talento natural para o boxe muay thai. Quando começa a lutar com maquilhagem feminina, alguns promotores da modalidade vêem ali boas possibilidades de marketing e o público corresponde, sobretudo quando Toom começa a ganhar combate atrás de combate. Baseado numa história real.
«Beautiful Boxer» é o yang para o yin de «Ong Bak» ou «Born to Fight»; um excelente contrapeso. Mas engloba também, em si mesmo, o equilíbrio dos opostos. É um filme onde figuram proeminentemente as artes marciais tailandesas, mas vai para lá da definição como "filme de acção".
Tratando-se da recriação de uma história real, os combates são mais “realistas” do que “espectaculares”. A utilização de praticantes de muay thai no papel dos oponentes do protagonista dá um grande contributo para a credibilidade das performances. O próprio Asanee Suwan é um campeão da modalidade e a wrestler japonesa Inoue Kyoko participa no filme, revivendo o desafio onde participou 15 anos antes.
Mas «Beautiful Boxer» é, formalmente e antes de tudo o mais, um drama sobre uma rapariga aprisionada num corpo de rapaz. A "fuga" deu-se finalmente em 1999, com a almejada operação de mudança de sexo.
Nong Toom, ou Parinya Charaenphol, apadrinhou o filme sobre a sua vida, trabalhando inclusive como consultora dos rituais de dança associados às exibições de muay thai, directamente com Suwan.
O travestismo e a homossexualidade são temas usados de forma recorrente, e com fins humorísticos, no cinema tailandês, mesmo em filmes mais sérios, como «Mekhong Full Moon Party» (2002). Recorde-se que um dos maiores êxitos do cinema local foi «The Iron Ladies» (2000), também baseado numa história real: o sucesso de uma equipa de voleibol constituída por transsexuais, travestis e homossexuais.
Esta tendência assenta, em parte, no facto da Tailândia ser um país particularmente "tolerante" em relação a opções de orientação sexual. No caso relatado em «Beautiful Boxer», poderíamos perguntar se o público aplaudia a acarinhava Nong Toom pela coragem e determinação em lutar contra as pressões sociais para fazer uma operação de mudança de sexo ou apesar disso.
Sendo certo que o humor não foi erradicado do ecrã, não é essa a tónica dominante num filme que permanece um ensaio válido sobre a luta de um homem — no ringue e no seio da sociedade — para poder tornar-se mulher.
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